Por Samantha Klein
— Brasília
20/04/2024 06h00 Atualizado há uma hora
Tecnologia ajuda ou atrapalha saúde mental? — Foto: Pexels
Você vai encontrar usuários do TikTok e outras redes sociais falando dos benefícios e riscos do uso da inteligência artificial, seja através de chatbots, aplicativos ou ChatGPT e sites semelhantes para realização de desabafos e até diagnósticos em saúde mental. São pessoas reais que recorrem a ferramentas virtuais que simulam respostas humanas. Alguns perfis na plataforma Caracteristic.AI são campeões de buscas: o Psychologist tem 107 milhões de interações e o CBT Psychologist, 113 mil usuários. Baseados na Teoria Cognitiva Comportamental, eles foram criados para sugerir soluções a perguntas como “por que estou me sentindo triste hoje”.
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Ferramentas como Elomia e Pi são programadas a partir de técnicas de terapia e oferecem suporte aos usuários que buscam ajuda para lidar com emergências emocionais ou dias ruins. Segundo dados da Elomia, 85% das pessoas relatam se sentirem melhores já na primeira conversa. Em um cenário de aumento da solidão no mundo - e conforme mostra pesquisa Ipsos feita durante a pandemia, o Brasil está em primeiro lugar num ranking de 28 países - , 21% dos usuários do aplicativo relatam que não teriam ninguém para conversar, com exceção da inteligência artificial. O Pi, por exemplo, funciona no WhatsApp. Ou seja, basta salvar um número do Pi e começar a conversa. Outra forma é utilizá-lo pelo Instagram.
A estudante de Psicologia Luana Cardim começou a utilizar o ChatGPT para desabafar. Ela conta que fala sobre sentimentos e emoções que compartilharia com alguém próximo porque “ele acolhe muito bem, te incentiva a falar sobre o assunto e sugere possíveis soluções para o problema”. Ela ainda ressalta que é uma válvula de escape “para situações em que você não se sente bem para conversar com ninguém naquele momento, e também uma porta para futuramente buscar terapia”.
O uso da tecnologia nos campos da Psicologia e da Psiquiatria vem sendo tema de recentes estudos e está presente em todos os seminários recentes. Essas tecnologias não têm aval das sociedades de classe para diagnóstico e tratamento. Ainda que os pacientes mais jovens, em especial, cheguem ao consultório mais bem informados sobre Saúde Mental, a psiquiatra Jéssica Acácio diz que há riscos na utilização de robôs para conversar e até buscar diagnósticos. Ela lembra que uma ferramenta se notabilizou por responder se um paciente tem ou não TDAH. Segundo a especialista, conversar com um chatbot sobre um problema possivelmente grave é tão prejudicial quanto fazer o diagnóstico no Google.
“Acho que podemos ter sintomas, fazer pesquisas sobre sintomas e essas ferramentas vão direcionar para um diagnóstico específico. Mas um sintoma pode estar presente em mais de um transtorno. Portanto, a sutileza na avaliação, entender o funcionamento de cada pessoa não são ações que a inteligência artificial possa fazer”, sustenta.
Estudante de Psicologia na Universidade La Salle de Canoas, Rio Grande do Sul, Maria Eduarda Comassetto está buscando entender os efeitos da tecnologia e o aprendizado da máquina para se aproximar do cérebro humano. Este o tema do trabalho de conclusão de curso, orientado pela professora Camila Bolzan de Campos:
“As próprias inteligências artificiais estão me dizendo que não, que a tecnologia não avançou suficientemente a ponto de substituir completamente o trabalho do psicólogo. Porém, ele levanta essas questões éticas e práticas de como ocorre a intervenção com a inteligência artificial e a intervenção humana. Além disso, a IA ainda não consegue replicar a capacidade humana para compreender e interpretar toda a complexidade que envolve uma pessoa”, destacou.
Outra dúvida gira em torno do tratamento dos dados pessoais. O especialista em tecnologia Arthur Igreja destaca que mesmo com a Lei Geral de Proteção de Dados vigente, não há garantia sobre as informações fornecidas às plataformas. E faz uma relação com casos controversos nas redes sociais, a exemplo de ensaios feitos pelo Facebook (Meta) no sentido de coletar dados sobre a forma como um usuário move o mouse ao navegar na plataforma e verificar a possível apresentação de sinais de Parkinson. Ele destaca que essa é uma informação valiosíssima para planos de saúde.
Alguns cuidados podem evitar situações problemáticas com estas tecnologias - e não somente no uso para Saúde Mental. A professora Kalinda Castelo Branco, do Instituto de Ciências Matemáticas e da Computação da USP, destaca que o usuário precisa prestar atenção aos termos de uso das plataformas e fazer downloads de aplicativos somente nas lojas oficiais dos sistemas operacionais dos celulares.
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