A jovem estadunidense de 22 anos Karlee Ozkurt teve um colapso irreparável nos pulmões após fazer o uso por cinco anos do cigarro eletrônico, ou 'Vape'. Ela fumou dos 15 até aos 20 anos.
“Os danos que causei ao meu pulmão parecem ser irreparáveis. Posso morrer aos 40 ou 50 anos e tudo por causa de um hábito que minhas colegas me incentivavam a ter”, disse, em entrevista ao tabloide inglês Daily Mail
Karlee teve dois colapsos pulmonares. No segundo, foi obrigada a fazer uma cirurgia de emergência e conseguiu parar de forma definitiva com o hábito. No entanto, o colapso pulmonar, ou atelectasia, causa danos irreversíveis ao órgão. Ele se caracteriza pelo escoamento do ar para o espaço entre os pulmões e a parede torácica. Com isso, o tecido do pulmão perde volume e se contrai, aumentando a frequência de quadros de pneumonia, por exemplo. Caso não seja tratado corretamente, o quadro pode evoluir para uma enfisema pulmonar.
O que é o cigarro eletrônico?
O cigarro eletrônico, ou 'Vape', chegou ao mercado com a promessa de ser menos agressivos do que o cigarro comum. Para Elie Fiss, pneumologista do Hospital Oswaldo Cruz, o produto veio como uma forma de ajudar as pessoas a abandonarem o vício do tabagismo. "O que, na realidade, foi uma forma de continuar com o vício, só que de outra maneira", alerta.
A Associação Médica Brasileira (AMB) afirma que a maioria absoluta desses produtos contém nicotina, uma das substâncias mais viciantes que existe. Ao ser inalada, a nicotina chega ao cérebro entre 7 e 19 segundos, liberando substâncias químicas que trazem sensação imediata de prazer. O nome 'Vape' vem da substituição da fumaça pelo vapor, segundo André Nathan pneumologista do Sírio Libanês.
"Inalando esse vapor, a nicotina também é inalada, entra nos pulmões e é absorvida, atingindo o cérebro e causando aquele sentimento de bem-estar que a substância proporciona, obviamente com todos os malefícios do vício", disse
Além da nicotina, Nathan ressalta que a composição do produto conta com propilenoglicol, utilizado para diluir a nicotina. Ainda não se sabe ao certo os efeitos da substância no corpo. Fiss acrescenta que algumas apresentações do produto contam com substâncias como THC (Tetrahidrocanabinol), também presente na maconha, além de vários sabores, concentrações e formulações diferentes.
Por que o Vape faz mal?
A curto e médio prazo, o cigarro eletrônico pode trazer alterações no sistema respiratório, como Evali, uma doença que surgiu por causa do Vape. Já a longo prazo, há riscos cardiovasculares apontados pelo uso do produto, principalmente relacionados às doenças coronárias, infarto, arritmia e insuficiência cardíaca, segundo Elie Fiss.
O que é Evali?
A sigla, em inglês, é caracterizada exclusivamente pela lesão pulmonar induzida pelo uso do cigarro eletrônico. Segundo Nathan, a doença, que se caracteriza por uma insuficiência respiratória aguda, é grave e pode levar o paciente para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI), com indicação de ventilação mecânica.
"Cada doença pulmonar tem uma causa. A asma, por exemplo, você nasce com essa predisposição. Outras doenças pulmonares são infecciosas, como pneumonia, covid, tuberculose. A Evali é uma doença inflamatória causada pela exposição às substâncias do cigarro eletrônico", afirma André Nathan
O pneumologista explica que isso acontece porque todas essas substâncias, quando são vaporizadas, ao entrar em contatos com os alvéolos pulmonares (onde acontecem as trocas gasosas) podem causar uma resposta inflamatória grande e, consequentemente, uma disfunção do pulmão.
Elie Fiss alerta que o mal pode ser fatal em muitos casos. "É uma pneumonia muito importante e já teve casos fatais, principalmente nos EUA, mas também no Brasil", alerta
De acordo com a AMB, o uso de cigarro eletrônico também foi associado como fator independente para asma, aumenta a rigidez arterial em voluntários saudáveis, sendo um risco para infarto agudo do miocárdio, da mesma forma que os cigarros tradicionais.
Qual é pior: cigarro eletrônico ou comum?
Os especialistas afirmam que não há estudos sobre os efeitos a longo prazo do cigarro eletrônico, já que ele é recente. No entanto, de acordo com Nathan, a quantidade de nicotina presente no cigarro eletrônico é muito maior do que a do comum.
"Nesse sentido ele é, sim, mais nocivo, porque causa uma dependência química mais rápida do que o cigarro normal, por levar níveis muito maiores de nicotina ao nosso corpo", explica
André Nathan alerta que outro fator que pode favorecer o vício no Vape e, consequentemente, fazer com que ele seja mais nocivo à saúde: permitir o uso dele em ambientes onde o cigarro normal não é permitido. "Socialmente, ele é mais fácil de ser utilizado. Isso faz com que você use mais", completa.
De acordo com Fiss, da mesma maneira que o cigarro comum, o Vape vai afetar o corpo como um "todo": "Ele aumenta a produção de ácido do estômago no refluxo; a depender da composição e concentração causa dor abdominal, náusea e vômito; hipertensão arterial; aumento da frequência cardíaca; irritação nos olhos; alterações de comportamento, dentre outros sintomas".
Ele ressalta que foram descobertas alterações, inclusive, na saúde bucal de usuários. Para ele, o vício é igual ao do cigarro normal. "É um vício, como qualquer outro, e há jovens que não conseguem se livrar dele", diz.
É melhor proibir ou regulamentar?
Os dois especialistas concordam que a proibição do cigarro eletrônico deve continuar no Brasil. Para Nathan, a medida deve vir junto com ações educativas nas escolas e, principalmente, propagandas alertando que o produto também faz mal, igual às propagandas antitabagistas, medida com que Fiss concorda e adiciona que o Vape deve ser proibido em locais público, igual aos cigarros comuns.
"Independente do lugar que você entre, o uso do 'Vape' deve ser proibido, como é feito com cigarro comum", disse Fiss "É preciso atuar na educação e na tentativa de inibir o marketing do cigarro eletrônico, principalmente relacionado aos jovens", opina Nathan.
No ano de 2022, a diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou, por unanimidade, um relatório técnico que indicava a necessidade de se manter a proibição dos dispositivos eletrônicos para fumar e a adoção de medidas adicionais para coibir o comércio irregular desse tipo de produto, além do aumento das ações de fiscalização e a realização de campanhas educativas.
Fora o debate no âmbito da Anvisa, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei (PL) 5008/2023, de autoria da senadora Soraya Thronicke, que permite a produção, importação, exportação e o consumo dos cigarros eletrônicos no Brasil.
Com um alto número de pessoas que consomem cigarros eletrônicos, a falta de regulamentação e o aumento do consumo irregular preocupam as autoridades.
Cerca de 83 países permitem a venda de cigarros eletrônicos, com prévia regulamentação da distribuição e composição dos dispositivos. A Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que é preciso tratar esses produtos da mesma forma que o cigarro normal, com adoção de medidas de controle e proibição dos dispositivos que tenham sabor.
Embora o produto seja proibido no Brasil, cerca de 2,2 milhões de pessoas fumam 'Vape', segundo pesquisa do Instituto Ipec - Inteligência em Pesquisa e Consultoria.
Fonte: SBT News
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