Foto: Arquivo/Cidadeverde.com
Mais de dois anos após o início da pandemia, a Europa volta a lidar com o avanço do coronavírus e um aumento de internações devido à doença. A sétima onda da Covid, impulsionada pela disseminação de subvariantes da ômicron, acende o alerta para o risco de uma explosão de casos no outono e no inverno no hemisfério Norte.
Epicentro das infecções no começo da crise sanitária, o continente voltou ao centro das atenções: o boletim mais recente da Organização Mundial da Saúde (OMS), na quinta-feira (22), mostrou que nos sete dias anteriores a Europa concentrou 44% dos novos casos no mundo.
O quadro, ainda que menos grave em relação a outros momentos, fez com que a OMS alertasse para a possibilidade do que chamou de meses difíceis depois do verão europeu, caso as autoridades não tomem providências desde já.
"Esperar para agir no outono [a partir de setembro] será tarde demais", destacou o diretor regional para a Europa, Hans Kluge. O número de novas infecções triplicou nas últimas seis semanas, e as taxas de hospitalização dobraram no mesmo período.
O Centro Europeu para Prevenção e Controle de Doenças (ECDC, na sigla em inglês) indicou que 12 dos 27 países da União Europeia relataram em 10 de julho aumento da ocupação em hospitais em relação à semana anterior, e que 23 registraram aceleração de casos em pessoas com 65 anos ou mais.
Ainda que as internações em UTIs permaneçam, por ora, relativamente baixas, 3.311 pessoas morreram no continente em uma semana, segundo a OMS –número distante do pico de janeiro de 2021, quando, ainda sem a proteção das vacinas, 40 mil pessoas perderam a vida no mesmo período.
A imunização tem taxas relativamente satisfatórias –segundo o ECDC, na UE 75,4% da população recebeu ao menos uma dose. Mas o ritmo de ampliação da cobertura vacinal deixou de avançar numa velocidade desejável. Mais de um ano depois do início das campanhas de imunização, a taxa da segunda dose no bloco é de 72,8%, a da primeira dose de reforço chega a 53% e a da segunda ainda está em 5,1%.
Autoridades de saúde não esperam que a onda atual provoque mortes nos patamares do primeiro ano da pandemia, mas especialistas expressam preocupação com a estrutura dos sistemas de saúde para uma possível enxurrada de novos infectados. Holanda, Hungria e Luxemburgo são os países da UE com o maior percentual de novos casos confirmados em uma semana (61%, 51% e 48% de aumento, respectivamente), e esse avanço não se limita ao bloco.
Editorial conjunto de duas revistas médicas britânicas enfatizou preocupações no Reino Unido ao indicar que, nos últimos 50 anos, nunca tantas áreas do setor de saúde estiveram tão perto de "deixar de funcionar efetivamente", prenunciando o que pode vir a ser um colapso em função da alta na Covid.
Foram 9.000 admissões hospitalares devido ao vírus por semana nos primeiros seis meses e meio deste ano; em 2021, a média era de 6.000, e, no primeiro ano de pandemia, 7.000, indicaram os editores de The BMJ e Health Service Journal, que também criticaram a falta de medidas enérgicas das autoridades.
"Infelizmente, o governo está preocupado demais em resolver os próprios desastres políticos para fornecer à população o apoio que precisa", diz Stephen Griffin, virologista da Universidade de Leeds. Segundo ele, o país tem filas em hospitais por falta de pessoal, ao mesmo tempo que o financiamento de medidas de combate à Covid vem sendo cortado.
Prevalecem entre as novas infecções na Europa as subvariantes da ômicron BA.4 e BA.5 –que superam a marca de 90% dos casos também no Brasil. Estudos apontam que as cepas, detectadas na África do Sul no início de 2022, são mais contagiosas do que as anteriores BA.1 e BA.2.
Outro aspecto que mudou são as medidas de prevenção. Nos últimos meses, governos europeus descartaram muitas das táticas usadas na contenção do vírus, entre as quais o uso obrigatório de máscaras, os testes em massa, o comprovante de vacinação e a exigência de testes para viajantes.
A flexibilização foi autorizada após o avanço da vacinação e a queda no número de mortes, mas contou com a pressão dos impactos econômicos dos lockdowns, agravados neste ano pela Guerra da Ucrânia.
Pesquisa global de março da consultoria McKinsey apontou a instabilidade geopolítica como principal preocupação para o crescimento econômico doméstico, seguida pela inflação e pela volatilidade dos preços da energia –a Covid, que liderava a lista, foi só o oitavo motivo mais citado.
Fora da Europa, outros alertas estão se acendendo. Nos EUA, de 4 a 11 de julho foram registrados 866,4 mil casos, aumento de 17,2% em relação à semana anterior. O número é quase quatro vezes maior do que a média de março, ainda que esteja longe do pico de 5,6 milhões, visto em janeiro. No país, onde a cobertura vacinal também avança mais lentamente, 67% dos habitantes estão com o primeiro ciclo de imunização completo, e a média de mortes é de 414 por dia.
Na ponta oposta, a África é o continente com o menor número de novos casos confirmados em uma semana, mesmo com a taxa mais baixa de vacinação –há que se pesar também a subnotificação. Segundo a OMS, 36,2 vacinas foram aplicadas no continente para cada 100 pessoas, bem distante das 171,2 na Europa e 188,15 nas Américas.
O aumento de casos e hospitalizações em várias regiões é explicado, em parte, porque a resposta imune das vacinas é menor contra as novas subvariantes –os imunizantes, porém, permanecem eficazes.
Segundo o presidente da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José David Urbaez, o quadro sugere que a Covid não se tornou sazonal e, com o surgimento de variantes, é difícil traçar uma perspectiva a longo prazo. "A pandemia não tem a mesma magnitude de antes, mas não temos como prever o fenômeno evolutivo das variantes. Por isso, governos precisam ser muito mais prudentes."
Fonte: Folhapress (Renan Marra)
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